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Entre um casamento e outro
19 de julho de 2013

 

"O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto."

Fernando Pessoa

O desejo de uma casa aconchegante. Um tapete de boas vindas. Uma vida fotografada e meticulosamente colocada em porta-retratos na mesinha de entrada da sala. Toma conta dos nossos anseios. Por vezes ficamos iludidos com os nossos desejos. Sem observar a vida com praticidade...

O afeto é um desejo permanente. Mas há custos em quaisquer escolhas que façamos na vida. Passei por dois casamentos e alguns namoros e não encontrei nas pessoas algo que fizesse valer a pena. Promovesse na alma aquele bom e velho sentimento pueril das máximas: “felizes para sempre” e “eu compreendo os seus defeitos diante das suas qualidades”.

Não desprezo os romances vividos. Foram bons apesar de efêmeros. Jantares. Músicas. Lugares. Presentes trocados. Filmes meticulosamente escolhidos. Outrossim houve um vazio irreparável no passar dos dias e essa sensação de incompletude propiciou uma amargura silenciosa e aos poucos nos afastou do que entendíamos fundamental.

O encontro de olhares e abraços acontece de modo diário. Por vezes um amigo que conhecíamos há muito tempo num lusco-fusco nos encanta. As bocas se encontram entre conversas sobre um “ex” ou sobre as necessidades afetivas que o destino ainda não nos permitiu resolver. Carências agindo como imãs e um namoro que dura pouco mais de um ano.

Frustrados. Novamente buscamos um reencontro com os nossos anseios. A solidão é recorrente. Procuramos alguém que nos ame ou que no fundo somente ouça as nossas angústias e temores. Colecionamos xícaras de café, taças vazias e por vezes chocolates. Compramos um novo cobertor para proteger o nosso corpo aflito e ansioso por afeto.

Corrompidos pela necessidade compramos roupas novas e novos sapatos. Renovamos a maquiagem. E intentamos novas histórias. Visitamos lugares novos. Aprendemos a dançar um ritmo que embale nossa alma. Chamando atenção do tempo para uma felicidade que existe no rosto, mas que não habita o nosso íntimo.

Com a iniciativa de auxiliar o destino. Colecionamos novas frustrações. Sentimentos afoitos e emoções descompassadas que nos levam a noivados desastrosos ou casamentos aparentemente felizes. Emoções que podem ser breves ou duradouras. Afinal a cegueira é diametralmente ligada a nossa incompletude emocional.

Buscamos em outras almas o que não encontramos ou não descobrimos em nós. Esse passo abismal nos condena a infelicidade ou a felicidade breve. Colecionamos poemas antigos. Caixas de cartas. Emoções em fotografias que são deglutidas com pesar. Diante dos nossos espelhos mudamos de cabelos e de marcas de aliança nas mãos vazias.

Entre um casamento e outro descobri quem eu sou. Entendi que os sonhos são importantes, mas é preciso partilhar isso com outra alma. Não há pessoa perfeita, mas os sentimentos podem e devem ser aprimorados. De toda sorte não encontraremos no outro a nossa imagem, mas tão somente o nosso reflexo. O nosso reflexo emocional...

Observo os casais em bodas de prata e de ouro. É certo que não as completarei, mas admiro quem supera as diferenças e potencializa as esperanças. Fabuloso reunir uma família entre filhos. Netos. Bisnetos. Primos. Tios e amigos. Nascimentos e aniversários - onde aquele rosto amado e afável está sempre junto ao amado - envelhecendo e sorvendo o tempo.

Imagino e escrevo sobre almas gêmeas. Sem  - no entanto - tê-la encontrado. Algumas coisas na vida são procuradas e nem sempre somos agraciados em ter aquilo que desejamos tanto. No fundo acabo por rir desse infortúnio. Afinal é como a sina dos poetas que morriam jovens e não tinham o compromisso irrefutável de encontrar um amor. O gracejo estava no sofrer.

Houve momentos especiais na minha vida afetiva. Outros dignos de um esquecimento fúnebre. Meu peito é um abismo emocional. Não tenho vergonha de escrevê-lo. Esmiuçá-lo. Até mesmo para a cura dos nossos males inoculamos um veneno. Na medida em que ele não possa nos matar e que ainda assim funcione como vacina.

Na caminhada para aquilo que chamamos “felicidade” é importante não desintegrar o sorriso entre as lágrimas. Não devemos perder a crença de que somos únicos no mundo e que mesmo sozinhos não estamos exauridos de nós mesmos. A diferença entre força é fraqueza está na concentração. Ser sempre sensato pode nos furtar boas emoções.

Creio que o melhor da história ainda está por acontecer – um novo amor. Um casamento verdadeiramente feliz... Imprescindível é afastar arrependimentos. Lágrimas não voltam aos olhos e as memórias devem ganhar o status de passado. Outras vozes, novas músicas, lugares especiais e novos poemas.

No meio disso há meus filhos que amo e sempre amarei. Bem como os enteados. Sonhos e realidades eternas conjugados da minha carne e das minhas ilusões. O melhor que divido com eles é a minha juventude contada em versos e fragmentos. Pois através das minhas parábolas nada sábias eu tento partilhar com eles o que há de melhor na existência – a busca do amor.

Taís Martins

Escritora, MsC, e professora.

Contato:  taisprof@hotmail.com

              focuslife@playtac.com

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Deixe seu comentário:

  • Tais Martins

    Obrigado meus amigos Denise e Allyson. bjs carinhosos...

  • Denise Maria Mendes

    Corajoso e revelador de uma consciência de que o essencial é ñao perder a capacidade de amar. Todo amor é legítimo, ainda que ñao compartilhado dentro das expectativas dos incautos apaixonados em busca "do felizes para sempre". O que realmente importa é que tenha durado o suficiente para que se aprenda mais sobre si e sobre o outro e depois de tudo, tente outra vez.

  • Allyson

    Rasgou o verbo com classe. Muito bem escrito. Parabens..