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Tomando café com o passado
28 de junho de 2013

"Não fazemos aquilo que queremos e, no entanto, somos responsáveis por aquilo que somos"

 Jean-Paul Sartre

Cabelos mais alvos. É como se o tempo desbotasse as matizes pelo uso. Revelando que fizemos aniversários. Que beijamos na pracinha. Que escrevemos cartas e e-mail’s cheios de esperança de uma vida que planejamos um dia. Mesmo que ela não tenha acontecido exatamente como gostaríamos ela desabrochou.

Quantas imagens perpassam nosso caleidoscópio emocional. Beijos de chegada ou de despedida. Sonhos indescritíveis onde voávamos enlaçados em céu azul ou irrompíamos no entardecer com aquele cenário róseo embalando os nossos melhores desejos de alegria. Desenhávamos castelos ou simples casas simpáticas para abrigar a felicidade.

O calor do líquido na xícara vai aquecendo o peito. E mesmo sem interlocutor, contamos a nossa vida. Desarquivamos lembranças. Sugerimos mudanças de atitude. Revivemos por breves segundos os melhores beijos. Que nem sempre foram os primeiros. O significado de cada enlace. De cada pétala que tocamos e daquelas que usamos para uma despedida.

Sob os holofotes brilhantes os pequenos recortes ganham projeção de cinema. Cenas, enredos e contexto que vivemos desde a Universidade. Como reencontrar quem fomos e como descobri quem somos. Diante das inúmeras páginas diárias que não escrevemos, mas sentimos e amealhamos em nossos arquivos pessoais e profissionais.

Somos as mesmas almas. Mas agora temos extensões de nossas vidas. Afinal nossos filhos povoam nosso tempo. Nossas emoções e nossos pensamentos. Fatalmente nos perdemos nesse processo entre saber o que nos é necessário. E o que para eles é indispensável. Repentinamente não somos mais prioridade.

O Capuccino chega e a leveza da fala se restabelece. Ele me conta do novo trabalho e eu dos livros que escrevi. Rimos da vida. Outrora éramos dois adolescentes que entravam para a universidade e queriam mudar o mundo. Liam livros e propiciavam revoluções. Até bem pouco tempo, eu guardei as camisetas na chapa que montamos chamada Reação.

Os espelhos dos olhos nos mostram como estamos mudados. Conto dos divórcios vividos e dos amores que nunca se efetivam e ele me devolve confissões rememorando seus antigos auspícios. Perguntamos mutuamente o que faríamos de diferente. Onde erramos. Quais os melhores acertos e como seria o desfecho das nossas histórias de vida.

O café quentinho nos recorda do jantar de eleição da chapa estudantil. Como foi difícil a peleia e ao mesmo tempo quanto prazer em mostrar que éramos idealistas. Num átimo de segundo nos encaramos e juntamente vem à questão – faz tanto tempo assim? Mudamos a ponto de ter como prioridade as compras do final de semana e uma leitura de trabalho.

Novos risos e falamos sobre uma vida plena. Sobre o aniversário de quarenta anos. E como sempre nos meus delírios de poeta disse que farei uma grande festa. Afinal quando completei 15 anos não pude debutar e que faria isso de modo tardio, mas com toda pompa e charme. Com um vestido lindo e com muitos amigos.

Ele falava da família e que em breve os filhos estariam na faculdade. Um novo susto, pois dois mais velhos leia-se quase na idade da minha filha (16 anos) -  eu peguei no colo e participei dos primeiros aniversários. Somente a pequenina eu não vi nascer. Afinal os tempos de trabalho eram outros e minha vida estava também atabalhoada.

A tarde ia se consumindo e a agradável conversa chegava ao seu termo. Longe das literaturas éramos novos personagens. Ontem jovens e hoje pais em busca de futuros coletivos. Cheios de projetos de segurança e sem movimentos muito bruscos. Fica uma dúvida pairando a respeito do destino. Mas essa resposta é inalcançável...

Nos despedimos com a promessa de novos encontros. Afinal não trabalharíamos mais na mesma universidade. E a amizade acaba sendo coligada ao tempo em que estamos trabalhando. Um abraço cheio de afeto. Nos despedimos na frente da panificadora que já nem existe mais na rua Augusto Stresser.

Imagino que um dia voltaremos a nos falar. De toda sorte penso nos rumos das nossas vidas. O tempo mostrará nossos equívocos e vitórias. E quiça fará sobressair nossos erros. Há muitas coisas das quais não falamos e talvez nunca falaremos. Sobra então a incógnita do tempo. Sobre os medos e anseios que não revelamos durante o café. Quem sabe um dia...

Taís Martins

Escritora, MsC, e professora.

Contato:  taisprof@hotmail.com

              focuslife@playtac.com

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LITERATURA e POESIA
Os caminhos da imaginação pela Escrita

Deixe seu comentário:

  • Gilvania Rocha da Silva

    Tais, você sempre penetrando no mais íntimo do ser humano. Lindo texto que nos leva a uma profunda reflexão... parabéns.Sucesso. Beijo

  • Denise Maria Mendes

    Uma história de amor feita de retalhos de passado onde o futuro se apresentava pleno de cores e de vida, quiça, compartilhadas. Mas, no tic-tac do tempo, que só vai, inevitavelmente, as coisas mudam e a pessoas também e, com elas, as prioridades. Mas, quem sabe, um dia, entre um café e outro, ainda haja tempo para recomeçar...

  • Bernadete Sullivan

    Mais uma vez,com a mesma suavidade,me foi colocado um texto gostoso e relevante. As peripécias das nossas vidas sempre estao em pauta,esse texto trouxe-me lembranças de outrora,e ao mesmo tempo a pespectiva de como será os tempos vindouros.....

  • Valdir Miguel de Souza

    Mais um trabalho inteligente dentro da literatura e poesia, coerente e gostoso de ler. Parabéns Tais.

  • Jessica Fonferko

    Adoreiii, beeeijos!

  • Camila Ferreira

    PERFEITOOOOOOOO.... DE TODOS OS TRABALHOS QUE EU Jà LI, EIS AQUI O MAIS BELOOOOOOOO, NA MINHA OPINIÃO...

  • Maria Helena Martins

    A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida...infelizmente ou felizmente a vida é assim.